terça-feira, 2 de junho de 2009

Depressão

Depressão

Nas suas formas mais graves, é a forma mais aguda de sofrimento humano, levando ao desespero e ao suicídio. A depressão é a nossa resposta natural à desilusão e à perda e só desaparece quando conseguimos esquecer e pôr o passado para trás das costas. Também podemos ter momentos de depressão dificilmente explicáveis, como quando temos um "dia não" ou estamos "de mau humor". No entanto, na depressão patológica, e tal como sucede com a ansiedade c as perturbações do humor, a depressão é continuada, grave e desproporcionada com relação àquilo que a causou.

A depressão é muito frequente. Em geral, uma em cada oito pessoas tem uma depressão patológica e, pelo menos, um terço de nós virá a ter uma depressão num momento das nossas vidas. Também as crianças podem sofrer desta doença.

 

Sintomas

Os principais sintomas da depressão são:

• Sentir-se "em baixo", sem esperança e sem vontade de viver, sobretudo no início do dia;

• Apresentar um aspecto infeliz — um rosto inexpressivo c triste c os lábios caídos;

• Falta de interesse, de satisfação, de motivação e de desejo sexual;

• Falta de auto-estima;

• Culpa, autocensura e sensação de futilidade;

• Perda de concentração e da vontade de conversar;

• Ansiedade e agitação;

• Dúvidas, indecisão e irritabilidade;

• Fadiga, lentificação dos movimentos e do discurso:

• Falta de apetite e perda de peso;

• Perturbação do sono, sobretudo acordar demasiado cedo.

 

 Os indivíduos deprimidos fazem uma apreciação negativa de si próprios e esperam que os outros partilhem essa opinião. Desvalorizam tudo o que de bom conseguiram no passado como tendo sido fortuito ou irrelevante. Em casos de depressão profunda psicótica, acreditam que são incrivelmente perversos, uma vergonha ou um mal para a humanidade e que toda a gente sabe não só da sua maldade como também fala constantemente dela, inclusive planeando a sua (merecida) eliminação deste mundo. Outros delírios típicos dos doentes deprimidos incluem a convicção de que estão contaminados ou arruinados, que as suas entranhas estão entupidas ou até que não existem ou serão mortos (delírio niilista). Nos casos mais graves, a agitação dos doentes é assustadora, passando por uma busca constante de apoio que depois não é aceite, ou por uma lentificação tal que chega à inacção e ao negativismo total, com o doente a não dizer, comer ou beber absolutamente nada. Este tipo de letargia é uma emergência médica que pode levar à morte por inanição.

A depressão afecta a memória, sobretudo de pessoas mais velhas, seja porque retarda o raciocínio, seja porque prejudica a atenção ou leva a um extremo abatimento. É então que o medo da demência se junta aos sintomas depressivos: "Estou a perder a razão!" Há casos em que a memória é profundamente afectada e a depressão assume a forma de pseudodemência. A recuperação destes casos é total, ao contrário da verdadeira demência.

Aparecem associados à depressão vários sintomas físicos, como sensações de pressão na cabeça, cefaleias, palpitações, dores e uma permanente sensação de cansaço. Em depressões mais ligeiras, estes sintomas sugerem uma doença física que o doente procura tratar. Em casos mais graves, uma doença incurável pode até ser bem-vinda.

Um em cada sete doentes que sofrem de depressão profunda suicida-se. Quando isto sucede, é comum os familiares e amigos interrogarem-se sobre os motivos que ninguém conhece. O que sucede c que os laços afectivos ficam como que adormecidos pela depressão e o doente sente-se um fardo para os entes queridos, convencendo-se de que passarão melhor sem si. Nesse extremo de sofrimento e angústia, em que a pessoa se sente demasiado mal para continuar a viver, o suicídio faz sentido. Em casos bastante trágicos, é possível que um pai particularmente deprimido, por exemplo, decida "levar" a mulher e filhos consigo e os mate antes de se suicidar. Os homens e os idosos têm taxas mais elevadas de suicídio efectivo e as mulheres e os jovens de tentativa de suicídio.

 

Causas

É possível distinguir entre causas predisponentes e precipitantes. Aquelas abrangem:

• Hereditariedade, mais significativa em depressões bipolares (depressão alternando com fases maníacas) do que unipolares (depressões recorrentes sem episódios de mania) e em casos onde a depressão aparece em pessoas muito novas;

• Uma personalidade pessimista, introvertida ou obsessiva, os pessimistas possuem uma "enorme capacidade para ter pensamentos negativos", tendo elevada vulnerabilidade face à depressão;

• Ser mulher, o sociólogo George Brown demonstrou que as mulheres com três filhos menores de 14 anos, um companheiro que não lhes dá apoio, sem ninguém com quem conversar, com más condições de habitação e sem emprego fora da actividade doméstica correm sérios riscos de sofrer de depressão. A menstruação, o parto e a menopausa aumentam o risco de depressão. E como as mulheres são mais capazes de perceber e partilhar aquilo que sentem do que a maioria dos homens, a depressão é mais facilmente diagnosticada nas mulheres, que procuram mais ajuda médica;

• Perda da mãe antes dos 11 anos por morte, doença ou abandono;

• Ocupação, os agricultores e os médicos estão entre os profissionais que correm mais riscos de depressão e suicídio, mas um factor de risco ainda maior é o desemprego;

• "Desamparo aprendido" Experiências conduzidas pelo psicólogo Martin Seligman mostram que, quando as pessoas se vêem durante muito tempo em situações desfavoráveis que não podem influenciar nem mudar (como um idoso obrigado a ficar num hospital), as hipóteses de sofrerem de depressão agravam-se substancialmente;

• Debilidade física ou doença, as doenças crónicas e incapacitantes, como artrite, bronquite crónica, doença de Parkinson ou insuficiência cardíaca, induzem também isolamento, dependência, insegurança e depressão;

• Bioquímica corporal e cerebral, em caso de depressão, parecem ocorrer desequilíbrios nos níveis dos neurotransmissores que levam mensagens de um neurônio para outro, nomeadamente a serotonina, a noradrenalina e a dopamina. É provável que a acção dos antidepressivos faça que os níveis destes mediadores químicos voltem ao normal. As hormonas podem também ser importantes (por exemplo, os estrogénios circulantes), bem como os níveis reduzidos ou elevados da hormona tiroideia em casos de doenças da tiróide, cortisol elevado na síndrome de Cushing ou de melatonina (hormona do sono) na perturbação afectiva sazonal;

• O "relógio" biológico, estamos habituados a pensar em termos das 24 horas do dia, pelo que a nossa bioquímica oscila de acordo com o passar do mesmo. Os níveis de cortisol, substância produzida pelas supra-renais sob a influência da hipófise, são normalmente elevados de manhã e diminuem durante a tarde, mas, em caso de depressão, permanecem altos durante todo o dia;

    Medicações, alguns dos primeiros medicamentos usados para controlar a hipertensão eram responsáveis por depressões graves, já que diminuíam os níveis dos neurotransmissores cerebrais. O uso de esteróides, da pílula e de betabloqueantes (para tratar a ansiedade e a hipertensão) pode também conduzir à depressão. Frequentemente, as causas da depressão envolvem perdas pessoais (a morte de uma pessoa, o fim de uma relação ou a redução da esperança de vida, por exemplo, por causa de um enfarte ou de um diagnóstico de cancro). Certas infecções, como a gripe, a febre tifóide e a brucelose, podem também provocar depressão.

 

Diagnóstico

Uma depressão profunda e debilitante, com uma duração igual ou superior a um mês, é quase sempre uma depressão clínica. Porém, é preciso distingui-la de outras debilidades físicas como a anemia, as doenças da tiróide e a encefalite miálgica, e de outras perturbações mentais, como a esquizofrenia (sobretudo em doentes jovens) e a demência (em pessoas mais velhas), a ansiedade, a neurose obsessivo--compulsiva, as perturbações alimentares, o alcoolismo e a toxicodependência. Todos estes quadros clínicos podem estar associados à depressão, que é aqui um quadro secundário.

Há questionários e escalas de avaliação destinados a diagnosticar a depressão e a medir a sua gravidade. De entre todos, o que mais se aproxima de um teste laboratorial é o teste de supressão com dexametasona, baseado nos níveis persistentemente elevados de cortisol nas depressões graves, que tem no entanto sido mais utilizado na investigação do que na prática clínica propriamente dita.

 

Tratamento

Existem tratamentos psicológicos, farmacológicos e físicos.

• O tratamento psicológico é quase sempre apropriado e aplicável. O aconselhamento pode incluir escuta empática, identificação de problemas e de possíveis soluções, apoio constante, securização e encorajamento. A terapia interpessoal proporciona uma estrutura a este processo e a terapia cognitivo-comportamental lida em particular com os padrões negativos de pensamento que surgem com a depressão ou estão na sua origem. A psicoterapia dá especial atenção ao facto de a raiva reprimida ou suprimida poder aparecer sob a forma de depressão (o suicídio é aqui considerado como uma expressão de raiva autodirigida), tentando revelá-la e lidar com ela.

• O tratamento farmacológico (com antidepressivos) deve ser um complemento aos tratamentos psicológicos e é essencial nas depressões graves e quando os doentes se mostram demasiado preocupados, agitados, não colaborantes ou desmotivados para colaborar na psicoterapia. Graças a estudos clínicos controlados com placebo apurou-se que os antidepressivos são eficazes em casos que vão da depressão moderada à profunda. Este tipo de fármacos foi descoberto na década de 1950, quando se verificou que alguns medicamentos usados no tratamento da tuberculose faziam desaparecer os sintomas de depressão associados àquela doença. Os primeiros antidepressivos (tricíclicos) funcionavam, mas tinham efeitos secundários preocupantes, como secura da boca, obstipação e sedação. Anos depois, surgiram os SSRI, como a floxetina (inibidor selectivo da recaptação da serotonina), e os antidepressivos acabaram por vulgarizar-se. Não mais eficazes do que os fármacos anteriores, a tolerância aos SSRI é francamente melhor. Ao contrário do que se pensa, os antidepressivos não causam habituação nem são "pastilhas de felicidade". De facto, actuam elevando os níveis dos neurotransmissores desregulados (como a serotonina e a noradrenalina) no cérebro para que se passe de um estado depressivo para um normal, mas não têm qualquer efeito euforizante se os níveis dos neurotransmissores estiverem equilibrados. Como os efeitos destes fármacos são cumulativos, podem levar mais de duas semanas a começar a fazer efeito e devem ser usados de forma contínua durante, pelo menos, seis meses para que a depressão fique bem tratada. Têm de facto efeitos secundários, sobretudo perda de apetite e disfunção sexual, que são contudo toleráveis e com tendência para desaparecer gradualmente.

 • O tratamento físico, a terapia electroconvulsiva (TEC), é eficaz nas depressões profundas e resistentes aos psicofármacos e sobretudo quando há risco de morte do doente por suicídio ou inanição. Ninguém sabe bem como é que esta terapia funciona, mas pensa-se que as convulsões (ataques) provocadas pelos electrochoques são benéficas. Os doentes são submetidos a electrochoques (com uma pequena passagem de corrente junto às têmporas) em segurança, sob anestesia. Os efeitos corporais desta convulsão resumem-se a uma ligeira e súbita contracção muscular causada por um relaxante muscular. Deve administrar-se uma série de 6-8 tratamentos ao longo de três semanas. Os psiquiatras são muito criticados por usarem este tipo de tratamento, mas continuam a fazê-lo convictamente, pois é uma forma rápida e eficaz de aliviar o sofrimento e o risco de morte causados por uma depressão profunda. Quando os doentes chegam ao ponto de se recusarem a ingerir alimentos ou líquidos, a TEC pode salvar-lhes a vida, continuando a ser um recurso valioso (acompanhado ou não de psicoterapia) para os doentes nos quais os antidepressivos não actuam ou estão contra-indicados (por exemplo, grávidas).

 

Prognóstico

Se a recuperação de um episódio depressivo é a norma, nos casos de depressões resistentes, ou "refractárias", as melhoras não são tão visíveis e os doentes podem ficar com sintomas residuais, como apenas sentirem-se bem na parte da tarde, por exemplo. A depressão grave está associada a uma redução da esperança de vida não só devido ao suicídio como também ao desleixo pessoal.

Quando se sofre de depressão, o risco de recidiva aumenta também. Esse risco pode ser reduzido com recurso à psicoterapia ou à terapia cognitivo-comportamental, que ajudam o doente a lidar melhor com o stress; continuando ou voltando a usar antidepressivos que tenham resultado em crises anteriores; ou por meio de estabilizadores de humor, como o valproato de sódio ou a carbamazipina, que actuam como preventivos e se devem tomar toda a vida como terapêutica de manutenção.

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